segunda-feira, 9 de março de 2015

Maria Morena

Está perguntar-me se eu gostava de ter vivido um romance? Oh minha querida, quem não gostaria... Mas sabe, quando há pouco dinheiro, muitas dificuldades e filhos para sustentar, o romance fica para outra vez.

Eu até tive muita sorte, casei com o homem que escolhi e ainda hoje é muito meu amigo.

O nosso casamento foi muito bonito. Pobrezinho, é verdade mas ninguém ficou sem comer e beber. Não tivemos as modernices todas que existem agora, nem uma fotografia para a lembrança, o meu vestido não era comprido, com cauda e véu e o fato dele era o de domingo. Mas lá casámos.

Se fui feliz? Fui... à nossa maneira mas sim, acho que fomos e que ainda somos!

Sabe, lembro de ainda ser jovem e às vezes ler às escondidas as fotonovelas que muito de vez enquanto dava para comprar e sonhava que era uma daquelas raparigas, com aquelas roupas chiques que elas usavam. Normalmente, haviam sempre dois pretendentes muito bem parecidos que lutavam para ver quem ficava com ela! E era como se por um bocadinho, vivesse outra vida que não a minha e tivesse a oportunidade de ver coisas que nem conhecia. Não me recordo do nome da personagem mas havia uma que eu gostava muito, era médica e tinha uns cabelos muito compridos com uns caracóis muito grandes loiros!

Olhe lá para mim, está a imaginar-me loira e médica?!?! Ai meu Deus, só isto agora para me fazer rir!

Mas rapidamente tinha de acordar e voltar a ser a Maria de cabelos castanhos pelos ombros. Havia sempre tanta coisa para me fazer despertar e rapidinho. Nem queira saber a trabalheira que seis crianças davam, principalmente quando tinha de fazer tudo à mão, que não havia cá estas máquinas de agora. A roupa era lavada no tanque e seca ao sol, a comida era feita em dois tachitos e uma frigideira e olhe lá... que havia muita gente que nem isso tinha.

Acha que no meio disto tudo, nos lembrávamos de ser românticos, acha? O meu homem saia de casa ainda de noite e quando voltava, na maioria das vezes já eu e os miúdos dormíamos.

Era assim, que remédio. Como é que nos governávamos se não fosse assim.

Eu ainda trabalhei fora de casa durante uns tempos mas tive de parar que as crianças andavam sozinhas o dia todo. Para além de que o almoço e o jantar não se faziam sozinhos, nem as meias conheciam o caminho até à caixa de costura.

Hoje, reformados, com os filhos criados e os netos a chegar já fazemos um bocadinho mais de companhia um ao outro, damos uns passeios depois de almoço, falamos sobre as noticias, sobre os miúdos... Mais eu, que ele não é de muitas falas. Nunca foi.

Mas eu sei que ele é muito meu amigo.
E diga lá, há melhor coisa que isso?

Ainda hoje gosto de ver as novelas mesmo que agora já não sejam em papel. E às vezes ainda sonho em ser a médica dos cabelos loiros.

Mas olhe, se quer que lhe diga, depois olho para o meu pretendente e acho que a louraça é que ia gostar de ser aqui a Maria morena!

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